sexta-feira, 22 de julho de 2011

CINEMA:Marcos Paulo estreia muito mal em "Assalto ao Banco Central"

DivulgaçãoBarão é um bandido tão "inteligente", que até joga xadrez

Segundo foi divulgado, o diretor Marcos Paulo há tempos alimentava o sonho de fazer cinema. Sonho esse que já lhe dava comichão, já que mesmo após completar 40 anos ligado à teledramaturgia — com um sucesso indiscutível — ainda não havia conseguido emplacar uma obra de sua autoria na tela grande. Deu que em um dia daqueles em que a sorte sorri alegre, em um jantar despretensioso com a sua esposa, a atriz Antonia Fontenelle, e o manda-chuva de boa parte das produções de sucesso mundial da Rede Globo conheceu a boa ideia de sua amada: filmar a história do folclórico assalto ao Banco Central de Fortaleza, ocorrido em 2005.

Para quem não sabe, em um final de semana de agosto daquele ano, bandidos surrupiaram com classe a pesada quantia de R$ 164 milhões em notas velhas de R$ 50. O feito se tornou o segundo maior assalto a banco da história, e o maior do Brasil. Após três meses de intensas escavações a partir de uma casa nas redondezas, um túnel estruturado — com um projeto que previa escoras, iluminação e sistema de ar-condicionado — foi construído no arenoso solo da capital cearense e desembocou no chão do cofre do banco, deixando caminho aberto para que as três toneladas de papel-moeda semiapodrecido fossem levadas e boa parte até hoje não encontrada.

Pois bem, a hora havia chegado para Marcos Paulo, que com o auxílio da produtora Total Entertainment ("Se eu fosse você" 1 e 2, "Divã" e "Sexo, Amor e Traição"), viabilizou em tempo recorde o seu projeto, que estreia em todo o país neste fim de semana. Porém, se engana quem acha que conhecerá os segredos do roubo. No filme, os fatos principais foram modificados, com a desculpa esfarrapada de que a história real envolveu muita gente e que seria impossível transportar para a produção com competência o que realmente aconteceu na ocasião. Conversa fiada. No fim das contas, a mudança foi só o primeiro de uma série de erros que transformaram “Assalto ao Banco Central” em uma das piores obras brasileiras desde a retomada da produção nacional — hoje quase atingindo a maioridade.

Mineiro (Eriberto Leão) e Carla (Hermila Guedes) formam o triângulo amoroso com Barão

Vamos por partes, começando pelo roteiro. A história desenvolvida por Renê Belmonte já inicia errada. Um bandido com o sugestivo nome de Barão (Milhem Cortaz) conta para sua namorada Carla (Hermila Guedes) que está planejando o super-roubo e precisa de um especialista para o trabalho. Ela responde que conhece o homem certo para isso, mas que estaria preso: Mineiro (Eriberto Leão, eterno namorado da Tiazinha). Dali, parte-se para a cena clichê do presidiário saindo cadeira, típica de filmes americanos, em que o libertado busca seus pertences no “almoxarifado” da prisão. Pela forma como Marcos Paulo apresenta o personagem, o espectador tem a impressão de que é um bandido dos mais competentes, que sabe tudo sobre o crime. Porém, durante toda a projeção, o personagem não faz absolutamente nada de relevante para o roubo, e só não passa despercebido porque acaba se envolvendo com a mulher do chefe.

Além disso, o diretor erra feio no desenvolvimento da história, com uma desnecessária montagem não linear que no início do filme mostra simultaneamente o planejamento do assalto e a investigação do crime. Tal expediente não tem utilidade e parece apenas uma frescura de Marcos Paulo, que busca uma linguagem cinematográfica para fugir de seus vícios televisivos, que voltam à tona a todo momento com cortes de novela em diálogos e planos fechados nos personagens. Quando o diretor tenta criar um conflito entre os policiais federais Telma (Giulia Gam) e Amorim (Lima Duarte), ela nova e afeita a tecnologias e ele mais velho, porém com um “faro” a toda hora citado, a estética de seriado fica escancarada. Assim, os dois não chegam nem a bater muito de frente como o diretor gosta de comentar.


Os diálogos em si são outro ponto constrangedor. Os textos são primários, com Barão (o diretor não consegue explicar por que mete tanto medo nos seus comparsas só por olhá-los de relance) dizendo frases feitas e dando sempre a última palavra ameaçadora, enquanto a bandidagem mais pé-de-chinelo e os policiais abusam de incontáveis ditados populares. Estão lá “Camarão que dorme, a maré leva”, “Passarinho que come pedra, sabe o ** que tem”, “Beiço de jegue não é arroz doce” e mais um bocado de tiradas engraçadinhas, que transformam o que Marcos Paulo chama de “suspense” em um filme de comédia e não apenas com toques de humor, como pretendido.

DivulgaçãoTelma (Giulia Gam) e Amorim (Lima Duarte) não chegam a bater de frente

A trilha sonora de “Assalto ao Banco Central” é risível. Quando o foco está em Barão, toca-se as cordas angustiantes, quando é Carla se insinuando para a quadrilha de homens trabalhando pesado, parte-se para o sax e bateria (na tocada do tema da “Pantera Cor-de-Rosa”), quando surge uma imagem aérea dos bandidos fugindo com a grana — em um comboio de vans totalmente ridículo, que na vida real daria mais bandeira que o apartamento caro pago em “cash” por um dos assaltantes — liga-se o pedal do heavy metal. É um chavão atrás do outro. Dose.

Mas o pior de tudo fica por conta da interpretação de Vinícius de Oliveira, o garoto de “Central do Brasil” que após o sucesso como ator mirim nunca conseguiu chegar a algum lugar relevante. Devanildo, seu personagem é um evangélico com traços efeminados tão caricaturado que envergonha. O rapaz caminha como se participasse de uma prova de marcha atlética e fala o texto com tanta dificuldade que parece um ator de teatro de colégio.

Não foi dessa vez que Marcos Paulo conseguiu tirar proveito de sua experiência atrás das câmeras. A diferença entre as linguagens de TV e cinema é um abismo e os 40 anos de telinha foram apenas um peso que o diretor carregou ao tentar passar de um lado para o outro. “Assalto ao Banco Central” talvez seja um filme pequeno demais para ser a realização de um sonho de um diretor com tanto sucesso na sua própria seara.

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